Canção para um menino

Paulo Machado

Olhei-te, e o menino sorriu
Com o lado direito da boca.
Um sorriso só dele, só teu, só nosso.
Aquietei frêmito os desejos contidos,
E me fiz palhaço, rei e súdito no tempo do ontem,
Em ruas sem datas, em datas perdidas,
Só dele, só tuas, só nossas.
Deixei em cada abraço dado um todo do meu nada.
Solto e despido de mim corri para ti,
E tocamos as mãos imaginárias do menino,
Expulsando nas falas o verde do sonhar.
Éramos nus e sem formas,
Belos como os deuses, mágicos como as auroras,
As tardes de chuva, as noites de frio com letargia e sono.
Em simbiose mensuramos o velho,
Tocamos a cauda do presente, e com a luz néon das galáxias
As utopias nasceram, e as manhãs despertaram mágicas e suaves.
No universo do menino , fizemo-nos amantes
Numa terra sem códigos e leis, onde é permitido o blefe,
E a censura jaz num sepulcro à beira da estrada.
E os nossos corpos mornos pelos desejos
Pediram carícias, enlevos, enleios…
Cansados em nós,
Olhamos o menino adormecer na estrela recém-nascida
E refeita na explosão de vida
Parida por mim, por ti, por nós..
Deixamo-nos adormecer num tempo sem hoje, sem ontem e amanhã,
Sobrevivendo na poesia do menino carente que dorme em cada um de nós.

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